Interdição-e-curatela-2023
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INTERDIÇÃO E CURATELA EM NOVOS TEMPOS

Recebimento de aposentadorias de pessoas com deficiência

Reflexos e mudanças no instituto da Interdição em face do Estatuto da Pessoa com Deficiência – curatela para recebimento de proventos de aposentadorias e pensões de incapazes

Da série “educação previdenciária”

1 – INTERDIÇÃO/CURATELA

O Brasil aderiu aos termos da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiência celebrada em Nova York, em 30 de março de 2007, regularmente aprovada pelo Decreto-Legislativo 186/2008.

Com isso, citada Convenção adquiriu o status de Emenda à Constituição Federal, conforme prescreve o disposto no art. 5º, parágrafo 3º.

Posteriormente, o Congresso Nacional aprovou o Estatuto da Pessoa com Deficiência pela Lei 13.146, de 06 de julho de 2015, regulando, dentre outros interesses das pessoas com deficiência, a Interdição e a concessão da Curatela anteriormente reguladas pelo Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002).

Todo esse arcabouço jurídico (Convenção e Estatuto da Pessoa com Deficiência), resultou em profundas modificações no sistema de proteção de incapazes.

Vale realçar que tanto a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência como o Estatuto aprovado pela 13.146/2015 tiveram o propósito de tentar desestigmatizar a pessoa com deficiência, abolindo assim a pecha de percepção negativa na sociedade relativamente ao exercício de direitos desse grupo.

Com isso, buscou-se reinserir esse grupo com vistas a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais, observando apenas as limitações físicas, mentais, sensoriais ou intelectuais no tempo e espaço, sem estabelecer diagnóstico de definitividade em nenhuma das hipóteses de Interdição e Curatela.

Vale dizer que mesmo os incapazes podem e devem exercer seus direitos civis e fundamentais, nos limites das respectivas capacidades, reservando-se a interdição e curatela residualmente para situações específicas, com limitação temporal, sempre com a perspectiva de reinserção social em igualdade com os demais cidadãos.

Cabe destacar que depois das alterações do Estatuto da Pessoa com Deficiência (2015), as da legislação civil, que originalmente tinham 5 hipóteses de Interdição e Curatela do Código Civil, foram reduzidas em apenas 3 situações especificadas na nova redação do art. 1767 do Código Civil:

“I – aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

III – os ébrios habituais e os viciados em tóxico

V – “os pródigos”. (novo art. 1767 do Código Civil).

Importante esclarecer que em nenhuma das hipóteses é possível prefixar quanto à definitividade da ausência de capacidade civil, sendo que a Curatela, quando necessária, deverá abranger e apontar o espaço de representação frente a incapacidade civil e declinar o tempo de validade da ordem judicial (Curatela).

Vale destacar que a Curatela pode ser exercida por mais de uma pessoa de forma compartilhada, na forma do disposto no art. 1775-A do Código Civil.

2 – Tomada de decisão apoiada

2.1 – Alternativa à Curatela

Como alternativa à Curatela, instrumento tradicional do Direito Civil que consiste na nomeação pelo Poder Judiciário de uma ou mais pessoas para responder pelas decisões de pessoa incapaz civilmente, foi criado um novo sistema denominado “Tomada de decisão apoiada”.

Na forma regulada pelo art. 1783-A do Código Civil (alterado pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência), “a tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas idôneas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informações necessários para que possa exercer sua capacidade”.

Os requisitos e elementos dessa nova modalidade de tutela judicial, como base no apoio da pessoa com deficiência por duas ou mais pessoas, estão detalhados nos 11 parágrafos do art. 1783-A do Código Civil.

Em suma: o incapaz tem como alternativa à interdição valer-se do apoio de 2 ou mais pessoas, formalizando tudo isso num pedido judicial.

2.2 – A nova regra chamada “tomada de decisão apoiada” não equivale a ter 2 ou mais conselheiros informais pelo incapaz?

Sim. Entretanto, a nova medida simplesmente formaliza (judicialmente) a atuação de 2 ou mais pessoas de confiança do relativamente incapaz. Vale dizer que as pessoas escolhidas pelo incapaz ficam, a partir do deferimento judicial da medida, oficialmente nomeadas pelo interessado, consistindo alternativa à interdição nas hipóteses cabíveis em que o incapaz ostenta capacidade civil com limitações.

Outro aspecto não previsto pelo legislador como consequência dessa nova medida, mas que seguramente pode ser útil em caso do agravamento da incapacidade, está na hipótese de ser necessária a interdição e concessão da curatela.

Nessa hipótese de agravamento da doença e da necessidade da interdição, pode o Poder Judiciário valer-se do procedimento antes requerido pelo incapaz (escolha de 2 ou mais pessoas para ajuda e orientação em decisões da vida civil), nomeando-os para atuação como curadores, considerando que o próprio interditando havia eleito essas pessoas como de confiança para fins de aconselhamento e orientação quanto às decisões da vida civil.

Ou seja, a chamada “tomada de decisão apoiada” pode ser uma medida “preparatória” a uma necessidade subjacente de interdição e concessão da Curatela, considerando-se para tanto que os “Curadores” (conselheiros) já estariam “autorizados” pelo interditando.

3 – Quais pessoas têm direito de requerer a interdição? Existe ordem de preferência das pessoas legitimadas?

As pessoas e entidades que podem requerer a interdição do incapaz estão listadas no art. 747 do Código de Processo Civil:

“A interdição pode ser promovida:

I – pelo cônjuge ou companheiro;

II – pelos parentes ou tutores;

III – pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o interditando;

IV – pelo Ministério Público”.

Importante realçar que não há ordem de preferência para requerimento da Interdição, destacando-se para tanto precedente da 3ª Turma do STJ.

Num voto sobre a questão pertinente a ordem de preferência ou legitimidade para requerimento da interdição, o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva destacou que a “interdição pode ser requerida por quem a lei reconhece como parente: ascendentes e descendentes de qualquer grau (art. 1591 do CC) e parentes em linha colateral até o quarto grau “art. 1592 CC”.

E complementou: “O que se deve considerar, antes de tudo, é o interesse do incapaz, dado o caráter protetivo e assistencial que tem o instituto, já que mais grave que haver dúvidas a respeito da legitimidade é deixar um incapaz abandonado e à mercê de pessoas inescrupulosas e interesseiras” (decisão citada no site do STJ, 18.09.2023 – não existe referência ao processo por envolver Segredo de Justiça).

4 – Curatela para fins de recebimento da aposentadoria ou pensão

4.1 – Utilização da Curatela

Para efeito previdenciário, especialmente pela abrangência de idosos e incapazes notadamente no recebimento de proventos de aposentadoria ou pensão, a utilização da interdição e Curatela são muito comuns.

Inicialmente vale destacar que a Previdência Social não pode exigir Interdição ou Curatela para requerimento de qualquer benefício previdenciário (art. 110, A da Lei 8.213/91).

Ou seja, não pode a Previdência Social exigir Curatela (interdição) para que o incapaz requeira algum benefício previdenciário.

Diferentemente, entretanto, no caso de recebimento de proventos, aí sim, em caso de incapacidade total, há necessidade da Interdição judicial e obtenção da Curatela para que o curador possa representar o aposentado ou pensionista perante a Previdência Social.

4.2 – Tempo de validade da Curatela

Vale realçar que a implantação do Estatuto da Pessoa com Deficiência teve o nobre propósito de limitar a concessão de Interdição, seja considerando as incapacidades específicas do interditando ou o tempo de concessão da interdição.

Todavia, a limitação das interdições seja na amplitude e no tempo de validade da Curatela, com vistas a integração social do incapaz produz, por outro lado, dificuldades operacionais para curadores, especialmente em casos dramáticos de incapacidade permanente e reconhecidamente definitivos (para conhecimento científico presente), considerando que as curatelas (na nova redação normativa legal) são sempre provisórias (ou deveriam ser na forma da lei), obrigando os curadores a renovação das curatelas com os ônus processuais daí decorrentes.

4.3 – O aposentado por invalidez mental pode receber diretamente seus proventos?

Vale destacar que o STF já definiu que o recebimento dos proventos de aposentadoria ou pensão por incapaz mental não está, por si só, impedido de fazê-lo diretamente (recebimento dos proventos do respectivo benefício).

Há um precedente que resolveu a questão no âmbito do STF.

O caso aconteceu no DF. Norma legal aprovada no âmbito do Distrito Federal destinada aos servidores públicos locais vedava o aposentado por invalidez por doença mental receber diretamente o benefício previdenciário, motivando assim a atuação do STF que sintetizou a tese vencedora nos seguintes termos:

“A enfermidade ou doença mental, ainda que tenha sido estabelecida a curatela, não configura, por si, elemento suficiente para determinar que a pessoa com deficiência não tenha discernimento para os atos da vida civil”.

No voto do ministro do STF Ricardo Lewandowski (Relator), consta que para o Estatuto da Pessoa com Deficiência “nem toda pessoa com doença mental está sujeita à interdição e, por consequência, à curatela, que passou a ser proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso”.

Em decorrência dessa compreensão do Estatuto da Pessoa com Deficiência, o Supremo Tribunal Federal cassou a norma do Distrito Federal que negava o direito do aposentado por invalidez (servidor público) decorrente de doença mental receber diretamente seus proventos, devendo fazê-lo “apenas por Curatela”. (RE 918315 – Tema 1096).

Por essa razão, a Previdência Social (INSS) ou qualquer regime previdenciário de Estados ou Municípios não pode impor regra geral quanto à obrigatoriedade de apresentação de Curatela para recebimento de aposentadorias por invalidez ou pensões de incapaz mental pelos próprios titulares dos respectivos benefícios.

4.4 – Não há “incapacidade definitiva” para o Estatuto da Pessoa com Deficiência

Outro ponto crítico nessa limitação do alcance e o tempo de duração da curatela, está também na discussão do impacto dessa limitação na concessão de benefícios por incapacidade, já que a Previdência Social, INSS e outros regimes previdenciários trabalham com esse conceito de definitividade para fins de concessão de benefícios de aposentadoria por invalidez ou pensão que impõe o reconhecimento da incapacidade (permanente, definitiva).

Ou seja, no âmbito da Previdência Social (Lei 8.213/1991), por exemplo, o segurado somente pode ser aposentado por invalidez ou dependente de segurado receber a pensão por morte, como incapaz, se houve configuração da incapacidade DEFINITIVA do segurado ou pensionista.

Já no âmbito do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/20015), o pressuposto é o contrário: nenhuma pessoa pode ser classificada como incapaz definitivamente, considerando que o propósito é sempre minimizar a incapacidade ou estabelecer seu caráter transitório, pouco importando a gravidade do quadro de doença da pessoa.

Obviamente que o propósito do Estatuto da Pessoa com Deficiência é nobre. No entanto, o conceito de incapacidade definitiva está intimamente ligado ao conhecimento científico presente.

Vale dizer: uma pessoa hoje pode ter uma doença incurável, estando definitivamente incapaz (para o conhecimento científico de hoje), mas não necessariamente no futuro. Mas o futuro está fora do alcance humano.

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